Aquela sombra no canto do quarto me persegue. Por todos os quartos e todos os cantos. Incomoda-me, é claro, simplesmente por não ser minha. Não sou eu. Acompanha-me, entretanto, a mim aderida como um apêndice, enquanto um paradoxo gira em torno de um vulto impreciso: não faz parte de mim, mas comporta-se como prolongamento de mim mesma.
O que é um canto escuro do meu quarto? Eu não sei.
Aquela sombra no corredor me perturba. Ela me encara; existe. Sólida como os meus temores, vaga como meus pesadelos: forte e intocável. Onipresente. Digo que não sou eu, não sou. Porque eu não me sou estranha, e não me sôo perigosa. Acaso qualquer um dos meus aspectos me escape, sei que, ao menos, sou capaz de identificá-lo. Eu não me perderia assim.
O que é que vive nos meus corredores? Eu não sou.
Aquela sombra acima da minha cama me tira o sono. Não consigo levantar os olhos, ver. Não quero ver mais, porque enxergar implica perceber sua existência constante e horrível. A essência dos meus medos tornou-se um vulto, e retorno submissa aos meus sete anos. As noites são impossíveis, solitárias, eternas. À noite eu sou uma criança.
O que é que flutua acima dos meus sonhos? Eu não quero saber.
Eu quero acender a luz, quero ascender à luz.
O resto é resto: apêndice.