segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

Sombra

Aquela sombra no canto do quarto me persegue. Por todos os quartos e todos os cantos. Incomoda-me, é claro, simplesmente por não ser minha. Não sou eu. Acompanha-me, entretanto, a mim aderida como um apêndice, enquanto um paradoxo gira em torno de um vulto impreciso: não faz parte de mim, mas comporta-se como prolongamento de mim mesma.

O que é um canto escuro do meu quarto? Eu não sei.

Aquela sombra no corredor me perturba. Ela me encara; existe. Sólida como os meus temores, vaga como meus pesadelos: forte e intocável. Onipresente. Digo que não sou eu, não sou. Porque eu não me sou estranha, e não me sôo perigosa. Acaso qualquer um dos meus aspectos me escape, sei que, ao menos, sou capaz de identificá-lo. Eu não me perderia assim.

O que é que vive nos meus corredores? Eu não sou.

Aquela sombra acima da minha cama me tira o sono. Não consigo levantar os olhos, ver. Não quero ver mais, porque enxergar implica perceber sua existência constante e horrível. A essência dos meus medos tornou-se um vulto, e retorno submissa aos meus sete anos. As noites são impossíveis, solitárias, eternas. À noite eu sou uma criança.

O que é que flutua acima dos meus sonhos? Eu não quero saber.
Eu quero acender a luz, quero ascender à luz.

O resto é resto: apêndice.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Peças do Eu

Let me welcome you ladies and gentlemen
I would like to say hello
Are you ready for some entertainment?
Are you ready for a show?
Gonna rock, gonna roll you
Get you dancing in the aisles
Jazz you, razzmatazz you
With a little bit of style
C'mon, let me entertain you!


Gosto de transmutar entre vítima, vilã e heroína. Centrar-me no palco da minha vida, do modo que melhor me convier. Esconder-me na coxia quando a platéia estiver insatisfeita. Mudar o figurino, a maquiagem e a expressão, de acordo com cada peça de humor, cada musical, cada drama. Prefiro assumir a produção, direção, escolha do elenco e até mesmo a iluminação a ser empregada apenas, e estar à disposição da terceira pessoa. Aprecio a função dos coadjuvantes do meu teatro, admitindo, porém, meu egoísmo ao encará-los todos assim: coadjuvantes... enquanto a estrela maior brilha em meu nome, e mesmo o Sol curva-se à minha grandeza celeste.
Enquanto "Eu" é o nome que ofusca todos os outros, o nome em todas as bocas. O nome que é meu.
"Eu". Soa bem.
Eu, atriz da realidade. Pretensões a parte.

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Pedra (Você In Natura)

Fria, dura,
Estática
Rocha.

Rígida, rija,
Corrija-me.

Seja acertando o meu corpo
Ou errando a minha alma,
Machucando o coração.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Antes e Depois

Por que a impressão da tua passagem
Dividiu a minha existência
Em duas?

A certeza de tua presença
E a esperança da tua companhia.
O calor do teu abraço
E a frieza mórbida da tua tez.
Os dias
E os dias.

Como, a partir do fim,
Ensaio o primeiro passo em direção à vida?

Quero recriar-me toda:
Começar do zero.
Juntar-me a mim mesma de novo.

Quero o pretérito
No presente.

Bate de frente minha vontade
Com algo chamado realidade.
E afastam-se cada vez mais
Minhas partes.

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Seu Pandeiro, o Padeiro

Corre o tempo, e eu só desejei que ele parasse de vez. Que congelasse, nos meu cinco anos de brincos de pressão da vovó e pique-esconde com o Seu Pandeiro, o Padeiro. A idade em que eu ainda respeitava as palavras-cruzadas do vovô, uns dois dias antes de assistir à Linha Direta e descobrir quão frágil poderia ser a vida. Antes de ter medo até de faca de cozinha, e antes daquela noite de estômago revirado porque, mãe, eu não quero morrer, não.
Depois daquele dia passei a ter uma sensação muito estranha. Como se o mundo fosse pequeno demais para mim e, ao mesmo tempo, muito maior que a imagem que fizera dele até então. Mas não é um pensamento, é uma dor-de-cabeça. Que vem em ondas geladas no momento e de vez em quando. Porque ainda sinto isso algumas noites, quando não consigo dormir. É como se eu não tivesse corpo, só uma prova de mortalidade. E medo de mim mesma desiludida. O chão se abriu debaixo de mim junto com os meus olhos, algo assim. Foi difícil crescer.
Ainda é.

Seu Pandeiro, eu sempre neguei teu pão. Volta logo, que só agora percebi que tenho fome...


-

Dedicado a João Salim Miguel.


"Deus é gracioso, perfeito, são. Quem é como Deus?"

quarta-feira, 10 de setembro de 2008

Minha vida, meu amor, meu tudo
Meu boneco de veludo
Meu pé de jacarandá
Vamos, sim, melhorar.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Fantástico

Caprichoso, extravagante, incrível, extraordinário, prodigioso: só existente na fantasia ou imaginação.
Céu e mar são para mim um só azul. Não existo a partir da linha do possível. Para quê, afinal? A tua raça é velha e já viu de tudo. Exceto o feérico bioma do além, o incandescente prazer do deslumbramento, o mistério das suposições livres, a realização do irrealizável. O Fantástico.
Sou o mais profundo do teu ser recalcado por humanidade. Encerraste-me na mesma gruta onde vivem teus opróbrios, e acreditas que sou digno de tais companhias. Talvez até penses em mim como pecado.
Tanto faz, azar o teu.
Porque, mesmo preso, sou livre, porque sou impossível, porque posso fazer qualquer coisa. E tudo. E nada. Depende.
Meu poder é o que sou, bicho-homem. Meu poder é meu querer, e meu desejo é fantástico.
Todavia eu reconheço que tu me fizeste: eu vim de ti.

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Doida

Cara, quer saber?
Eu me amo muito! Juro...
Eu só tenho os meus olhos para ver o mundo;
E os meus olhos só têm o meu corpo para existir.
Então tá, né.


Doida.

domingo, 3 de agosto de 2008

Oi

Bom, acho que quando voltei estava muito ocupada e acabei esquecendo da manutenção desse treco aqui.
Hoje, então, vou falar sobre o meu dia:
Eu tive dois tempos de aula de História (Independência da América Espanhola) e tive mais uma prova de que algumas pessoas simplesmente insistem em não entender, ou entender a coisa errada.
Sabe?
Tá, provavelmente não. Vou explicar: Os filhos de Chapetones NÃO SÃO Criollos!
Aí foi Física, mas ninguém prestou atenção, já que o Viajante tava dando aula. Eu achei legal, porque ele falou sobre as perguntas básicas da religião. Mas o Viajante precisa rever isso, porque ele só apresentou duas, e se não me engano eram cinco os questionamentos básicos das religiões (quem sou eu, de onde vim, para onde vou, onde estou e quem me criou. O Viajante só falou da primeira e da quarta). Depois foi Física de verdade, já que o Marcelo roubou um tempo do Viajante para revisar refração. Quis preparar-nos para a prova de laboratório, que será na terça que vem, eu acho.
Também aprendi por que os fones de ouvido têm ímãs, mas eu já esqueci a explicação, visto que sou jegue.
Depois o recreio, com a Jade e a Mari, porque a Patricia faltou e a Gi ainda não voltou da viagem (na verdade, ela já deve ter voltado), e também com um Pedro vestido de malandro que mais parecia o Wally.
Aí tivemos Sociologia, e fiquei fascinada mais uma vez com as pérolas da minha turma. É o preço que pago pela ausência no ano passado...
Matemática (lapso).
A aula acaba e a Jade me pede carona porque ela é muito cara-de-pau. Por sinal, eu não gostei nem um pouquinho disso, a Jade é chata. Odiei principalmente a parte do jacaré.
EU SOU NORMAL.
No carro a Jade me contou fofocas da Alemanha e eu descobri que não conheço ninguém do colégio. E também vimos pessoas do Cruzeiro de identidades indefinidas na Av. Maracanã, mas temos suspeitos, o que é muito estranho (?).
E eu comi salpicão (só picão)! Mas eu peguei uma azeitona, o que é muito ruim... Vi Nosferatu, do Werner Herzog, também. E vi Batman Begins. E vi Batman - O Cavaleiro das Trevas. É, hoje foi o dia do morcego, duh.
O PV disse que eu sou o Coringa! Ah, eu tô cansada de falarem da minha boca. Antes que achem estranho, sim, eu sei que o nome dele em português é errado, o certo seria Curinga, mas o nome do personagem é esse, o que fazer?
Continuando... Ah, eu tô cansada de falarem da minha boca. Ela é normal.
EU VI A TAÍSSA!
Do nada. Tava dançando naquele treco do Playland, sei lá. A doida quebrou minha coluna e meteu medo no meu namorado.
Como se já não bastasse matar os indivíduos à sua volta com tanto carinho, Taíssa virou um perigo para si mesma. Ela quebrou o pé. (Sim, e tava dançando naquelas máquinas mongas de dança)
Taíssa é louca (pleonasmo brabo, esse).
Ah, e eu fiquei no cinema com o PV até às duas da manhã, porque a gente só conseguiu pegar lugar juntos na sessão de onze e vinte.
Eu amo muito ele, ele é o momô da minha vida, e a gente vai morar num castelo cor-de-rosa.
Hoje foi aniversário da minha mãe.
Ah, acho que só isso.

Viram porque não escrevo meus dias aqui?
Não tenho dom para isso.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

Comunicado

Gostaria de comunicar o retorno de Maria Júlia da Rosa Miguel Andrade Silva à presidência de sua própria vida.
*
Essência e escolha! Essência e escolha!
Me rocks, thank you very much.

quinta-feira, 26 de junho de 2008

Morangos

Eu sou terra.
Uma terra dura, embolotada e fétida. Terra marrom, sem-graça. Que suja, que é suja. Terra onde pisas, onde defecam os animais. Terra maltratada, machucada, da qual cavam do peito e do ventre e do meio da testa a matéria que é: terra. A que só te vê trabalhar e que não conhece nenhum dos teus prazeres no mundo. A que beija a sola de teus pés descalços.

Terra, a que é lama quando encontra a chuva.
A chuva é ela.

Ela refresca, é gostosa, roça teu corpo e molha a tua camisa. Escorre por tua boca aberta e sedenta, e te alivia. Mas a mim só transforma em lama. Em pastosa decepção.

Então resolvo que de mim brotarão morangos. Para sempre e só morangos. Vermelhos, suculentos, enormes e deliciosos morangos. Morangos que eu farei com a água que tiro da chuva.
Morangos que eu farei para ti.

Depois... depois a chuva pára.

Dimanche

Dans mes rêves j'ai vu tes secrets
Ton coeur dans ma poitrine
Et les étoiles.



Je ne parle pas français,
Mais je comprends!

quinta-feira, 12 de junho de 2008

MSN

G. diz:
Você ama tanto ele, mas tanto...
G. diz:
Que você cede tudo. Isso é amor.
G. diz:
Muito amor.
G. diz:
Amor acima do orgulho
M. diz:
Acho que sei onde você está querendo chegar

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Ócio (criativo?)

Alguém ainda vem aqui?


De qualquer jeito:
Estou num dia péssimo, não fui à escola e só consigo pensar no quanto sou medíocre.
Acho que tenho inveja de algumas pessoas que fazem o que eu sou.
Cantam, escrevem, desenham... criam.
Eu nunca tive inveja dessas qualidades, porque delas sempre usufrui naturalmente. Entretanto, sinto-me atrasada a cada dia que passa, enquanto este pensamento aos pouco me enfraquece, impedindo a ação, a revolta. Perdi-me na segurança infantil de estar sempre agradando e conseqüentemente não agrado mais ninguém. Estou pronta aos olhos do mundo, mas a meus olhos o mundo é o mesmo ambiente acolhedor a dizer "muito bem!" a cada mísera conquista de meu crescimento pessoal. Pois ainda estou crescendo, só eu sei... E com a relutância de um condenado.
O modo como sou vista pelo mundo simplesmente não é o modo como quero ser vista. Sendo assim, a confusão acerca de "quem sou" e "quem quero ser" é tamanha. Freqüentemente encaro a seguinte dúvida: "sou como me vejo ou sou como me vêem?"

Sinceramente, de mim para mim mesma, a melhor explicação para a fossa na qual tolamente me afundei é um ego espremido pelo superego.

Acho que vou soltar o id e mandar um "foda-se".


Psicanálise rules!

quarta-feira, 9 de abril de 2008

"Eu não escrevo o que quero, escrevo o que sou."
Clarice Lispector

E que isto sirva...

sexta-feira, 4 de abril de 2008

Eu por Ele

- Eu estou errada.
É o que preciso dizer para estar certa?
- É.

segunda-feira, 31 de março de 2008

Eu e a Tua Boca

Tive medo de me perder, pois que fiquei tempo demais no outro.
Um dia ainda entendo como (me?) ser!

Tua boca beijou minha mão, e um coração que creio ser o que é meu bateu e bateu num sorriso de mil dentes. Meus mil dentes. Eu toda desencadeada por ti... eu!

Penso que me encontrei.

segunda-feira, 17 de março de 2008

Nova Aurora

O teu olhar me sorri, o meu peito é tambor,
Amo na confusão de sentir (teu amor).

E temo pelo ocaso de nós dois;
E vivo a acreditar em nova aurora...
Depois.

terça-feira, 11 de março de 2008

Um Dia

Crescer me dói nos ossos, na pele e no hipotálamo. E incita-me a desistir de me ser, para ser apenas.
Sou o quê?
Eu já sou?
Eu vivo, respiro, escrevo e lhe garanto. Eu crio, eu faço.
Mas por trás disso há o quê?
Há "por trás disso"?
Eu cresço, eu sumo, me acho, me perco...
Ou finalmente vejo que nunca fui e nem serei (o que eu quero).


O que eu quero?

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Quando não se sabe

Foi como acordei: sem saber.

O teto parece-me atraente ao olhar, com sua pureza de branco gelo. "Eu tenho que arrumar este quarto", penso.
"Tenho que arrumar esta vida."
Fecho os olhos. Que dor estranha... é o medo da dor, mais que a dor em si. Eu não sei se vou senti-la, eu não sei como vai ser.
É mais angústia e frio do que qualquer outra coisa.

"Você sabe?"

Eu perguntei... mas não estou querendo descobrir.

sábado, 26 de janeiro de 2008

Vez

Ah, quando foi que me afastei da cega felicidade? A pseudo-satisfação dos sentidos, o prazer de voar numa gaiola de grades invisíveis?
Quando que escapei da prisão de mim mesma e, então, finalmente me fui por inteiro, fui o que sempre estive destinada a ser?
Quando das amarras do controle mundano me soltei para encontrar-me num céu de possibilidades infinitas?

Quando?

Vejo que viver transpassa a existência simples e banal. Vejo que viver é muito mais do que desejar a vida.

Viver é... não sei o que é viver, Meu Deus!
Viver me parece apenas não ser isto: tudo que já tentei até agora.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2008

Perfeita

"Bata as asas, anjo."

Ela está perdida em um labirinto de vícios e virtudes, quando poderia acabar com tudo, sobrevoar seus obstáculos. Decidiu ser ordinária. Escolheu os desafios renegando seus dons, dons que a distinguem de tudo que quer ser: humana e imperfeita; normal.

Errante por um caminho incerto. Passa-se um, dois, três dias.
Mas ainda é um anjo, e suas asas pesam: "você é perfeita!"

Quatro, cinco; o anjo pára. Olha ao seu redor e vê-se entre quatro muros de pedra. Está presa. Afinal, o labirinto lhe reservou para agora o teste maior. Atordoa-se, e em um dos cantos se deixa cair, encostando a cabeça contra a pedra. Os seus olhos se fecham. Não há solução para alguém comum.
"Mas você é um anjo... Abra os olhos."

E acima dela um céu crepuscular sorri, estendendo-lhe um caminho de nuvens seguras.
É viver ou morrer, anjo.

Então bate as asas, ganha altura e voa em direção oeste: o pôr-do-sol.
Ela é perfeita.

Mistério

O mistério tem tudo. Tem tudo pelo simples fato de poder ser qualquer coisa.

Imagine um mistério: Uma incógnita. Um não saber de infinidades. Uma infinidade de soluções. Eis que o universo escolhe somente uma para que nela se aplique a verdade.

E quando você a encontra, meu caro... elementar que se sinta um Sherlock.

terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Pingüim, Hiena

Desengonça, pára, encara. Bate o bico e bate o pé. Deita de barriga e acabou: Pingüim te conquistou.

A Hiena ri, é peluda, come restos e ri.

Sério, quem você leva pra casa?



Hiena diz: Pingüim fede a peixe!
Pingüim diz: Hiena fede.
Hiena: Pingüim tem uma bicanca horrorosa!
Pingüim: Hiena é horrorosa.
H: Pingüim... Pingüim é bonito.
P: Hiena é fei... Ahm?
H: Pingüim é seu.
P: Tá legal... Eu sou seu! Viu? Ganhamos!

Você: Mas eu só queria uma hiena...

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

Ferro

Causou-me uma dor... dor que pesou na face, nos olhos. Que tremeu as mãos, juntou-me os dedos em aflitos estalares. Dor daquilo que não se esperava.
Apenas uma surpresa. Mas tudo sempre fora tão previsível! Foi como deparar-me com espinho na rosa tratada: tão pequeno e me incomoda; tão pouco, tão nada... e me corta!
Como pode? Eu sou de ferro, quase morta.

Fez-me esquecer que não se rima em prosa... e que mentira só combina com o nariz grande do Pinocchio.
Pelo menos, como já dito (ou mentido), sou de ferro, não madeira.

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Consciência

E é assim: Paf!
Não sou mais interessante.
"E daí?"
Silêncio! Não sou mais interessante.
"É que já se sabe tudo sobre você, entende?"
Não, não mesmo. Não entendo.
Talvez...
Vou inovar, então.
Surpreender.
Ser nova.
"Ser outra."
Ser outra?
"É."
Não! Por que sempre me diz isso?
"Eu lá sei?"
Esquece, vou arranjar consciência mais interessante.